segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Por Assim Dizer

Por Assim Dizer é, em primeiro lugar, um ensaio onírico. Só depois um objecto de exasperação.


Daí ser essencialmente puerilidade, hipostasiação e desconforto. Das cordas invencíveis de uma guitarra barata, fazer vibrar palavras, versos brancos, poemas, coisas intangíveis. É um dedilhar memórias de pessoas por vezes coloridas e de lugares que nos são estranhamente familiares; um escrever estórias de amantes e pretendentes com as notas que parecem existir por baixo das teclas do piano. Cada nota é uma emoção diferente, única e intraduzível. Cada sofrido compasso, uma pequena metamorfose, um fragmento de vida, um luxo de passo para a morte. Mágoa em semínimas. Amor bemol.


Todas as melodias são cinzeladas à mão por este melónamo artesão. São texturas de sonhos, sereias subtis que se me escorrem das mãos, dos dedos para quaisquer ouvidos abertos. Um baixar as defesas. Mecanismos de silêncio. Os teus movimentos sem saída seguros por raízes. Para além de beleza, não têm nada a dizer. São paixões. Uma cópula carnal. Sinistra sinfonia de rosas.


O experimental e a descontrução são inevitáveis. Desinspirações imprevisíveis. São lograr cansaço. Regem-se pela ordem arbitrária de vácuos impalpáveis. Uma sépala de gestos mitigados. Um ruído é a infusão compósita de almíscar e tiquetaques negros. Uma vertigem espiral encerrada numa nuvem de éter. Uma sonolenta tarde de verão e arco-íris de areia em postais amarelecidos. Dedos mortos no fumo.


Cabe aos amigos um ténue perímetro de reconhecimento. Um lugar no tempo perfeito. Línguas de ópio. Sáficos, jâmbicos ou heróicos. Delicadeza de vidro na voz, grito de vapor poético. Fogo-de-artifício nos pulsos, nas mãos, nos lábios, nos dedos. Jovens valquírias e trovadores na noite.


O desejo é congregar todas as coisas. Amar um mundo. Nasce uma flor. Velhos inventários elegantes, com a velha glória das grandes nomenclaturas. Parece-me que já estive aqui antes. Fito a vaga remniscência. Este é o laborioso ofício da mais minuciosa lavra, executado na mais traiçoeira brenha. Mergulhamos entre as músicas, deixamo-las respirar, perdemo-nos na justeza de um murmúrio. Damos-lhe um nome. Damos-lhe um lugar. Damos-lhe um carácter. Damos-lhe vida, por assim dizer.

1 comentário:

telmo disse...

se fosses gaja... neste momento, deixava-te um comentário mais bonito. mas como és um ser masculino, de barba em erupção e rastas espigaçadas, deixo essas palavras para as meninas que tiverem o número de neurónios apropriado para o fazerem por mim.