sábado, 29 de janeiro de 2011

Música No Coração: Porque É, Que Será

Ser homem o suficiente para governar e administrar um projecto, até ao fim, consumir as suas imperfeições, sorver os seus defeitos. Ser homem o suficiente para assumir como minha qualquer canção que apanhe no ar, porque a música não é mais do que isso, vento fino, delicadíssimo, que se nos escorrega pela cara, pelos olhos, pela boca, pelo nariz, pelos ouvidos, aos sentidos, que se nos foge entre os dedos, Vou fugir de ti, apanha o que puderes, e que, ulterior a nós, nos oferece apenas um vislumbre de si, Anda atrás de mim.

Poucos conhecem os seus mistérios harmónicos, e aqueles que se dedicam a decifrá-los, os músicos cristos, pregam-na ao resto da humanidade, É esta a nossa religião, acreditamos na vibração, o som é a nossa forma de comunhão espiritual, e claro que Afinal sois músicos ou padres?, mas ainda assim, não esqueçamos, a música não é mais do que uma brisa divina muitíssimo anterior aos homens, que, cegos, ainda acreditam às vezes que são não só fazedores, mas também criadores de uma coisa que muito mais provável e verosimelmente os houvera criado a eles, em algum etéreo momento em que se sentia entediada com o excesso da sua própria beleza, merecendo por isso, com o mais profundo sentido de mérito, que sejamos homens o suficiente para governar um projecto nosso, não por direito, mas porque disso nos tornámos merecedores, que o tempo é o nosso mais merecido sacrifício, e que, pelo menos eu, porquanto pelos outros não poderei nunca escrevinhar assim, na minha condição de suficientemente homem, apanhe qualquer melodia no ar e a entregue a um ou outro par de ouvidos, sim, três vivas à juventude, da nota-morfema à melodia-palavra, da melodia-palavra à harmonia-linguagem, e agora é só esse o desígnio da minha existência.

Diz a douta boca do povo que, e porque não, um homem só o é depois de fazer um filho, escrever um livro e plantar uma árvore, não necessariamente por esta ordem, o meu subconsciente é que assim o quis, portanto perguntem-me, Já plantaste uma árvore?, de modos que me podem perguntar, Já escreveste um livro?, se vos aprouver, estejam à vontade, mas o meu filho é este aqui, inteiramente saído daqui de dentro, Sim, fui eu, fui eu que o fiz, mas ele já existia muito antes de mim.